terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Desmatamento Zero

Está na hora do desmatamento zero.

A Amazônia povoa nosso imaginário com suas florestas luxuriantes, rios caudalosos e riquezas naturais superlativas. Toda essa riqueza tem sido ameaçada por um ciclo de desmatamento que começou há mais de 40 anos e ainda persiste nos dias de hoje. Nesse período foram destruídos 20% das florestas (até a década de 1960 apenas 1% das florestas havia sido derrubado). Embora na última década o Brasil tenha conseguido reduzir o desmatamento em cerca de 70%, a perda de floresta na Amazônia ainda é preocupante. A persistência do desmatamento é um câncer que ameaça não apenas a floresta, mas dificulta o desenvolvimento econômico e social da região. Portanto, é hora de perseguir um desmatamento próximo de zero na Amazônia nos próximos anos. É claro que haverá muitos desafios e obstáculos para atingi-lo, mas há quatro razões que favorecem essa meta.
Já desmatamos toda a terra de que precisamos. De fato, a Amazônia já perdeu uma área florestal maior do que os estados de Minas Gerais e Paraná somados. Porém, quase 70% dessa área desmatada está subutilizada. Essa área devastada é mais do que necessária para abrigar toda a expansão de agronegócio, agricultura familiar, projetos de mineração e infraestrutura e o crescimento urbano. Em alguns lugares da Amazônia, como Alta Floresta (Mato Grosso) e Paragominas (Pará), os pecuaristas estão intensificando com sucesso suas áreas de produção. Além de poupar a floresta, estão aumentando a rentabilidade de seus empreendimentos.
O crescimento econômico não requer mais desmatamento. Na década de 1970, a Amazônia participava com menos de 8% do PIB do Brasil. Passadas mais de quatro décadas, depois de todo o desmatamento ocorrido, a região ainda patina nos mesmos 8% do PIB nacional. A economia baseada no desmatamento não contribuiu para melhorar a situação econômica da população da Amazônia. As pessoas fizeram sacrifícios enormes e comprometeram sua qualidade de vida ao substituir uma floresta exuberante por cidades caóticas e afetadas por fumaça de queimadas. Contudo, os benefícios desse crescimento com base no desmatamento foram colhidos apenas por uma fração pequena de indivíduos e empresas.
O valor da floresta é cada vez maior. Nosso entendimento sobre o valor econômico da floresta foi ampliado nos últimos anos. A Amazônia tem também um papel fundamental na regulação do clima de grande parte da América do Sul. É “provedora” de chuvas para o Centro-Sul do Brasil.
O mercado não quer mais o desmatamento. Destaca-se a iniciativa do Consumer Goods Forum, uma aliança das principais empresas globais, cuja receita bruta anual supera os US$ 4 trilhões (mais de duas vezes o PIB do Brasil), que assumiu a meta de desmatamento zero até 2020. Ou seja, a partir dessa data, essas empresas deixarão de comprar carne, soja, óleo de palma, madeira ou papel e celulose que venham de áreas recém-desmatadas na Amazônia e nas outras florestas tropicais.
É claro que o fim do desmatamento, embora desejável e necessário, não será imediato nem fácil. No curto prazo (até 2020) será necessário atingir no mínimo um desflorestamento abaixo de 3.900 quilômetros quadrados por ano e perseguir um desmatamento zero a partir de 2020, assumindo que qualquer novo desmatamento deverá ser recompensado com o plantio de floresta nativa. Infelizmente, a crise fiscal e política que se abateu sobre o Brasil tem dificultado o avanço dessa agenda. A Amazônia ainda tem cerca de 70 milhões de hectares de florestas públicas “desprotegidas”, ameaçadas pela grilagem de terras e subsequente desmatamento. A Amazônia precisará se tornar prioritária na agenda nacional, o que requer uma política de desenvolvimento para a região que enfatize o uso intensivo das áreas já desmatadas, a economia florestal com seus ativos da biodiversidade e serviços ambientais, a valorização da imensa riqueza cultural e étnica e a conservação da vegetação remanescente.
Fonte: Beto Veríssimo ( Época)

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