sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Os números de um Brasil que “cospe no prato” do meio ambiente.

Sabe aquele provérbio que diz “não se cospe no prato em que se come”? Comumente usado para designar pessoas ingratas, que não reconhecem o bem que alguém ou algo lhe faz, o dito se aplica à realidade do investimento público brasileiro no meio ambiente e seus recursos naturais, essenciais ao sustento da vida e de várias atividades econômicas.

Apenas R$3,7 bilhões de reais compõem o orçamento para o ano de 2018 do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e suas autarquias, como Ibama,  ICMBio, Agência Nacional de Águas (ANA) e Serviço Florestal Brasileiro. O valor é inferior aos R$3,9 bilhões autorizados para o ano passado e ainda menor do que os R$5 bilhões liberados (em valores corrigidos pela inflação) para o ano de 2013, o melhor da década em termos de investimento no meio ambiente.
Ao longo dos últimos cinco anos, o país acompanharia os desdobramentos de uma crise hídrica sem precedentes na maior metrópole do país e o vazamento da barragem da Samarco na cidade mineira de Mariana, ao mesmo tempo em que reduziria em R$ 1,3 bilhão o volume de recursos destinados ao financiamento de ações ambientais.
Os dados integram um amplo estudo sobre os gastos públicos em meio ambiente no país realizado pelo grupo WWF-Brasil e a Associação Contas Abertas. A pesquisa, divulgada nesta terça-feira (06), considera os gastos da União, Estados e municípios nos últimos dez anos, e aponta uma queda no investimento público provocada pelo cenário de aperto fiscal e agravada pela falta de visão política sobre a importância estratégica em se conservar o meio ambiente e os recursos naturais renováveis.
Os números revelam uma tendência de cortes em áreas como o monitoramento e fiscalização do desmatamento, a conservação da biodiversidade e a gestão dos recursos hídricos, que provêm serviços essenciais para a sociedade, como o equilíbrio climático, alimentos e água.
Uma das principais vítimas do desmonte da área ambiental foi o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, autarquia vinculada ao MMA e responsável pelas Unidades de Conservação (UCs), que viu seu orçamento cair quase pela metade —de R$ 1,25 bilhão de gastos autorizados em 2017 para R$ 708 milhões em 2018 , uma redução de 44%.
Ações orçamentárias que tratam de criação, implantação, monitoramento e projetos de manejo em áreas protegidas, começaram o ano com R$ 236 milhões, contra R$ 252 milhões liberados em 2017.
O Bolsa Verde, programa que paga R$$ 300 a cada três meses a famílias extremamente pobres e que moram em áreas protegidas, como incentivo à conservação, desembolsou R$ 61,7 milhões em 2017, ante os R$ 78 milhões de 2016 e os R$ 106,1 milhões em 2015. Segundo o estudo, a área veio perdendo recursos até desaparecer no Orçamento de 2018, por proposta do Executivo, acatada pelo Congresso.
Recursos hídricos
Essenciais ao sustento da vida e de várias atividades econômicas, os recursos hídricos também enfrentam dias de vacas magras. No ano em que o Brasil sedia pela primeira vez o Fórum Mundial da Água, que reunirá representantes de mais de cem países em Brasília no final do mês, a verba destinada para a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos caiu de R$$ 181,7 milhões autorizados em 2017 para R$$ 136 milhões, em 2018.
Pasta esquecida
Os gastos autorizados do Ministério do Meio Ambiente são inferiores ao de vários outros ministérios, representando pouco mais de 20% do Orçamento do Ministério da Agricultura ou 10% do orçamento concedido ao Ministério de Minas e Energia.
Pouco retorno
O estudo do WWF e da Contas Abertas destaca ainda que as políticas ambientais recebem uma parcela pequena dos tributos arrecadados pela exploração de recursos naturais, como água, florestas, petróleo e demais recursos minerais, que renderam mais de R$ 400 bilhões aos cofres públicos na última década, em grande parte repassados aos Estados e municípios.
A exploração de petróleo e gás é a que mais rende receitas à União entre os recursos naturais (foram R$ 353 bilhões de reais em 10 anos) mas nenhum centavo vai para o Ministério do Meio Ambiente. A maior parcela do dinheiro arrecadado é repartida pela União com Estados e municípios. A água vem na sequência, com receita arrecadada de R$ 28,7 bilhões em dez anos, dos quais cerca de R$ 1 bilhão foi destinado ao MMA.
Desigualdades regionais
O estudo também revela desigualdades nos investimentos regionais em meio ambiente. O Estado e o município de São Paulo lideram o ranking dos que mais gastaram em gestão ambiental tanto em 2016 como nos quatro anos anteriores. No Estado, quase metade (42%) dos gastos do ano passado foi para pagamento de pessoal.
No município, a maior fatia das despesas com conservação ambiental foi destinada à conservação, operação e manutenção de parques. Sozinha, a cidade de São Paulo registrou despesas três vezes maior do que todo o Estado do Pará ou 6,5 vezes o montante gasto pelo Estado do Amazonas.
Fonte: Exame

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