segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Grupo indígena do Brasil aposta em ‘fruta dourada’ para fazer chocolates finos.

Segundo estudioso sobre cacau, a variedade encontrada em comunidade indígena é de alta qualidade
Estima-se que 15% da população local nessa área no extremo norte do Brasil morreu de malária e outras doenças levadas para a área pelos garimpeiros. Julio testemunhou como o influxo de estranhos rapidamente destruiu o mundo de seus pais e avós.
Garimpeiros invadiram a comunidade indígena de Waikas na década de 1980
Ele diz que a experiência o ensinou que ele deveria ser capaz de falar a língua e entender a cultura dos recém-chegados para saber como lidar com eles.
Então, Julio, como outros jovens membros do grupo Ye’kwana, foi morar em Boa Vista, a capital do estado de Roraima, onde nasceu.
Mineração de ouro deixou a terra marcada
Lá, ele se formou em administração de territórios indígenas e mais tarde tornou-se presidente da Associação do Povo Ye’kwana, que representa seu grupo indígena em nível nacional.
Ainda em Boa Vista, Julio teve ideia do preço que os chocolates finos podem ter no mercado internacional, e viu uma chance para o seu povo.
Comunidades antes remotas hoje têm que lidar com o fluxo causado pelo garimpo
Ele tirou fotos do que seu povo chama de “fruta dourada” e levou para o Instituto Socioambiental, uma organização não governamental que promove produtos indígenas.
A “fruta dourada” da floresta nativa de Waikas era a Theobroma cocoa, cujas sementes são usadas para fazer cacau em pó e chocolate.
Mas não é qualquer cacau. Um especialista em cacau do Instituto ATÁ, que trabalha em colaboração com a ONG que Julio havia originalmente se aproximado, descobriu que o fruto da floresta de Waikas tinha um formato diferente de todas as outras variedades que ele conhecia.
O especialista Roberto Smeraldi achava que poderia ser uma variedade pura até então desconhecida, que oferecia um grande potencial. Para tentar obter essa confirmação, ele se aproximou de Cesar de Mendes, um chocolatier que estuda o cacau.
As vagens de cacau nas florestas Waikas são diferentes de outras variedades
Mendes, que desistiu de sua carreira acadêmica como químico em 2010 para criar sua própria marca de chocolates da Amazônia, ficou intrigado e concordou em participar de uma expedição à floresta de Waikas para testar a teoria de Smeraldi.
Na floresta de Waikas, o chocolatier – que viaja pela região em busca de variedades raras de cacau para produzir chocolates de origem única – teve sorte.
Ele encontrou duas variedades distintas, uma com características que ele diz ser diferentes de todas as outras que ele conhece. Ele também organizou um workshop para ensinar os líderes das comunidades Ye’kwana e Yanomami como processar as cascas de cacau e as sementes para fazer chocolates finos.
É um processo que leva 10 dias, mas, no final, os participantes puderam experimentar a primeira barra de chocolate amargo feita a partir de sua “fruta dourada”. Onde essa barra poderá chegar dependerá da qualidade do produto final. Mendes levou as sementes que encontrou para sua cidade natal, no estado do Pará, para tentar identificar suas espécies, origem e características.
A esperança é que o cacau se mostre tão raro e de alta qualidade quanto Mendes acredita que ele possa ser, já que isso pode aumentar seu valor de maneira significativa. Um cacau de baixa qualidade vendido como commodity no mercado de ações vale cerca de R$ 5,80, enquanto uma variedade de qualidade superior usada para fazer chocolates finos pode chegar a R$ 53.
Julio diz que a diferença que o cacau pode trazer à sua comunidade é enorme: “Hoje, não vivemos sem roupas e outros bens que vêm das cidades”.
“Precisamos de dinheiro, já que atualmente não temos nenhuma das nossas atividades tradicionais, e o cacau parece ser uma possibilidade”, diz ele.
“Temos muito conhecimento sobre a floresta, fazemos muitas coisas que pessoas não indígenas vendem nas cidades. Nós as fabricamos para venderem lá”, explica. 
Pasta feita com a ‘fruta dourada’
“Se este projeto for bem sucedido, não teremos que ir à cidade ou trabalhar na mina de ouro para ganhar dinheiro.”
É um raio de esperança para sua comunidade em um momento de renovada ameaça. Nos últimos anos, o número de garimpeiros voltou a aumentar.
Julio e seus colegas líderes comunitários esperam que suas “frutas douradas” em breve sejam uma alternativa à atração da mineração ilegal de ouro.
Fonte: BBC



Nenhum comentário: