Seria possível reflorestar a Alemanha?
Após Alemanha cortar verbas para projetos de proteção à Floresta Amazônica, Bolsonaro sugeriu que dinheiro fosse usado para reflorestar o país europeu. Mudanças climáticas e falta de espaço indicam cenário desanimador.
Grandes áreas de florestas desapareceram nos últimos anos. Árvores cortadas para abrir estradas e para uma agricultura que precisa cada vez mais de espaço. A morte das florestas assume formas dramáticas, e os danos chegam a bilhões de euros. Essa é a atual situação na Alemanha.
"Não precisamos falar sobre reflorestamento na Alemanha enquanto não pararmos o desmatamento em grande escala. Os interesses econômicos da indústria e também dos transportes sempre estão à frente da ecologia no país", afirmou Jana Ballenthien, especialista em florestas da ONG alemã Robin Wood.
Em apenas um ano, as florestas alemãs perderam 120 mil hectares, uma área do tamanho de Berlim, segundo a organização Sociedade de Proteção da Floresta Alemã (SDW). E elas voltaram a ser um tema de debate agora que as queimadas na Amazônia e suas possíveis consequências devastadoras para o clima chamam atenção mundo afora.
As atitudes do governo de Jair Bolsonaro em relação ao meio ambiente e o avanço do desmatamento levaram a Alemanha a suspender, em meados de agosto, o repasse de 35 milhões de euros (cerca de 155 milhões de reais) a projeto de proteção da Floresta Amazônica e da biodiversidade no Brasil. Em resposta ao congelamento dos recursos, Bolsonaro sugeriu que a chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, usasse esse dinheiro para reflorestar a Alemanha.
"São necessários no mínimo 150 anos para o reflorestamento ideal de florestas na Alemanha, com uma grande diversidade de espécies de árvores de diferentes idades e um sistema ecológico funcional", afirmou Ballenthien.
A ministra alemã da Agricultura, Julia Klöckner, da União Democrata Cristã (CDU), se reúne nesta quinta-feira (29/08) com proprietários de florestas, silvicultores e ambientalistas para conversar sobre a situação das florestas e as mudanças climáticas.
De acordo com a estimativa de Klöckner, serão necessários 1,5 bilhão de euros (cerca de 6,9 bilhões de reais) nos próximos anos para salvar florestas alemãs que sofreram severos danos. Um reflorestamento massivo sairia ainda mais caro.
Efeitos das mudanças climáticas
Enquanto a Amazônia enfrenta desmatamento e queimadas, as mudanças climáticas que trouxeram secas e a proliferação de escolitíneos, uma espécie de besouro, castigam as árvores alemãs.
"Se houver chuva suficiente, as árvores conseguem se defender dos ataques de escolitíneos, pois produzem uma resina como mecanismo de defesa. Mas se houver pouca água, elas não produzem resina na quantidade necessária e se tornam uma presa fácil para os besouros", afirma Ulrich Dohle, presidente da Federação de Trabalhadores Florestais alemães.
Devido às mudanças climáticas, as árvores alemãs também não conseguem mais resistir a vendavais. "Elas simplesmente caem com ventos de intensidade sete ou oito, pois, com a seca, suas raízes se degeneram", acrescentou Dohle, engenheiro florestalresponsável por uma floresta no estado de Mecklenburg-Vorpommern.
Quando caminha por sua floresta, Dohle vê uma situação dramática. "Pequenos lagos e riachos simplesmente secaram. Em 2018, caiu apenas metade da chuva. Não vi algo assim nos últimos 20 anos", comenta.
A salvação das florestas alemãs requer um grande esforço. As monoculturas, que compõem um quarto dessas áreas, não resistirão ao aquecimento global e precisam rapidamente ser transformadas em florestas híbridas estáveis, principalmente com carvalhos e pinheiros.
"Se seguirmos o ritmo atual de transformação das florestas, terminaremos em 120 anos. As mudanças climáticas, porém, não nos dão esse tempo", afirma Dohle.
Tal mudança e reflorestamento precisam ainda de mão de obra. Mais engenheiros florestais precisam ser contratados, mas a realidade na Alemanha é outra.
"Nos últimos 25 anos, o pessoal florestal foi reduzido à metade. Essa redução foi tanta que na Saxônia e na Turíngia militares foram enviados para combater os escolitíneos", conta Dohle.
Falta de espaço
Um estudo do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique (ETHZ) causou recentemente barulho ao afirmar que o reflorestamento seria o meio mais eficaz contra as mudanças climáticas. Segundo o estudo, as novas florestas poderiam armazenar 200 bilhões de toneladas de carbono. Para isso, seria preciso que árvores fossem plantadas numa área do tamanho dos Estados Unidos.
Ballenthien, porém, questiona onde haveria espaço para árvores num país densamente povoado e focado na agricultura como a Alemanha.
"Temos aqui muitas instalações industriais, muitas estradas e o agronegócio. As terras que poderiam ser consideradas para o reflorestamento simplesmente não existem", acrescentou a especialista.
O sonho de um reflorestamento mundial se tornará uma utopia, se países como os Estados Unidos permitirem o desmatamento de florestas no Alasca. E ele também é impossível enquanto consumidores mundo afora não mudarem seus hábitos, reduzindo a ingestão de carne, por exemplo, diz a especialista.
Fonte: Deutsche Welle
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