Milhares de agricultores protestam em Berlim contra pacote de reformas.
Um a um, tratores de toda a Alemanha preenchiam a área do Portão de Brandemburgo, no centro de Berlim. Há dias, agricultores de todo o país partiram em direção à capital para participar de um grande protesto nesta terça-feira (26/11) e garantir assim a visibilidade do público.
Apesar de cientes do transtorno causado no trânsito na região, eles precisam atrair a atenção para a causa pela qual estão protestando. “Não podemos continuar assim. Não precisamos de regulamentação excessiva”, afirmou um fazendeiro da região de Norhorn, localizada na fronteira da Alemanha com a Holanda. Ele levou 11 horas para chegar a Berlim. “Não estamos dispostos a aceitar aquilo que os de lá de cima querem que a gente faça, sem nos consultar antes.”
“Os de lá de cima” são as ministras alemãs da Agricultura, Julia Glöckner, e do Meio Ambiente, Svenja Schulze. Em setembro elas apresentaram um pacote agrícola que prevê a redução do uso de fertilizantes, pesticidas e inseticidas para conter a morte de insetos e a contaminação de lençóis freáticos com nitrato, além do banimento do glifosato até 2023.
Cerca de 10 mil agricultores participaram da manifestação em Berlim, que exige uma mudança na política para garantir a sobrevivência do setor. Numa ação silenciosa, centenas de botas e sapatos de crianças foram colocados nos degraus da Coluna da Vitória, que fica do lado oposto do Portão de Brandemburgo, na Avenida 17 de Junho, representando as mais de 94 mil empresas agrícolas que fecharam suas portas nos últimos dez anos.
A vida no campo não é fácil na Alemanha. Além do trabalho duro, o pagamento é baixo. Os agricultores têm dificuldade de alcançar lucros diante das grandes despesas de produção. Com as novas políticas, eles temem que um controle maior sobre o uso de fertilizantes acabe provocando uma diminuição da produção, especialmente em zonas de solo pouco fértil.
“Sim, cometemos erros no passado, sem dúvida. Mas aprendemos com eles”, disse o criador de gado e suínos de Norhorn. “Ainda somos o bode expiatório da nação no debate do nitrato. Não estou convencido de que as medições recentes estão corretas. Tenho a impressão que apenas os casos piores foram relatados, mas somos todos obrigados a assumir a responsabilidade coletiva pelos poucos pecadores.”
O nitrato costuma ser utilizado em fertilizantes e está presente em esterco, mas em altas dosagens pode ser tóxico, tanto para plantas como para animais. Estudos indicam que a substância pode ser cancerígena.
“Queremos ver uma pesquisa honesta sobre de onde realmente vem o teor de nitrato dos lençóis freáticos. Não estou dizendo que nossos fertilizantes não contribuem para isso, mas existem outras causas. Nós, agricultores, somos os únicos alvos do governo e isso é injusto”, protesta um agricultor da Baviera.
“Se supostamente reduzirmos o uso de fertilizantes em 20%, como o governo deseja, isso significa que nossas plantas recebem 20% menos nutrientes por ano, e haverá um impacto correspondente na produção e na renda”, prossegue. “Eu adoraria que meu filho se juntasse ao nosso negócio, mas se não é possível viver disso no futuro, não faz sentido mantê-lo interessado.”
No palco montado no Portão de Brandemburgo, agricultores contavam suas dificuldades. Por volta no meio-dia, o microfone foi aberto às ministras do Meio Ambiente e da Agricultura. Inimiga favorita dos manifestantes, Schulze recebeu vaias ao defender a proteção dos lençóis freáticos e insetos. Klöckner, que vem de uma família de trabalhadores do campo, demonstrou uma compreensão maior para as demandas do grupo, mas tampouco entusiasmou os presentes.
Custos e preços
Os manifestantes reunidos em Berlim insistiram que os subsídios agrícolas são fundamentais para evitar que mais agricultores abandonem o campo. “Estamos frustrados porque não podemos viver dos preços dos nossos produtos”, afirmou a agricultora Antje Marufke, da Turíngia. “A política deveria estabelecer preços mínimos de venda, para que as cadeias de varejo sejam forçadas a aceitar preços mais altos, mas isso não acontece. Em vez disso, é trazida carne da América do Sul.”
“Se os preços dos nossos produtos fossem um pouco mais altos, não precisaríamos de subsídios. Mas haveria muita pressão de preços partindo do Leste Europeu e de outras nações, devido aos acordos comerciais, que estão dificultando nossas vidas com suas exportações baratas”, opinou um agricultor de Oldenburg.
Por sua vez, o agricultor da Baviera disse considerar os subsídios como pagamentos compensatórios pelos custos dos altos padrões de produção. “Sem isso, teríamos uma desvantagem devastadora no mercado em relação a países onde os padrões de produção não são tão altos”, reforçou.
Entre os manifestantes, há um sentimento geral de que o governo falhou ao não considerar os interesses do grupo, enquanto tenta pressionar por mais regulamentação. No fim do dia, os tratores iniciaram sua viagem de volta para as dificuldades do dia a dia.
Fonte: Deutsche Welle
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